Instrução | Psicologia
Durante a partida, esfrie a cabeça. Literalmente!
Por Gustavo Santos
11/06/2012 às 14h20

Todo tenista, independente do seu nível técnico, já ouviu o sábio conselho sobre "esfriar a cabeça" durante a partida. Apesar de parecer simples, este é um dos melhores conselhos que pode ser dado a quem se propõe a praticar este esporte. Por dois motivos: primeiro pelo aspecto psicológico, já que decisões tomadas sob forte influência emocional quase sempre geram resultados indesejados. E em segundo lugar pelo aspecto fisiológico, já que a hipertermia (aumento da temperatura corporal) resulta, entre outras coisas, em desvio do fluxo sanguíneo para a pele, suor, elevação dos hormônios do stress e respostas comportamentais (fugir do calor e desejo de interromper o exercício) contraproducentes ao desempenho esportivo.

Quem já enfrentou um terceiro set sob o sol escaldante do meio-dia, sabe o quanto é difícil manter a motivação e a intensidade durante os pontos. A vontade de terminar a partida o quanto antes cresce significativamente à medida que o calor aumenta. Muitos, de fato, desistem de lutar pelos pontos e acabam perdendo a partida. Isso ocorre porque o ambiente quente, juntamente com o calor produzido pela contração muscular durante o exercício impõe ao organismo grande desafio à termorregulação (tentativa do corpo em manter a temperatura interna constante). As respostas comportamentais de fugir do calor e de interromper o exercício são, na verdade, mecanismos de proteção utilizados pelo nosso corpo na tentativa de cessar este aumento da temperatura corporal.

O tempo de exaustão de um exercício é menor em ambientes quentes, que estão relacionados também à maior percepção de esforço quando comparados a ambientes frios. O aumento da temperatura corporal e, em especial, da pele, causa aumentos da concentração plasmática (no sangue) de um hormônio chamado prolactina, que além de estimular a produção de leite e do tecido mamário durante a gravidez, atua sobre centros motivacionais e de acionamento motor no cérebro. O aumento da secreção de prolactina durante o exercício em ambiente quente parece gerar intolerância ao estresse térmico, diminuindo o desejo de continuar o exercício, resultando em fadiga.

Para testar esta hipótese, pesquisadores ingleses submeteram 16 indivíduos ao estresse térmico (temperatura de 58°C em uma sauna com umidade relativa do ar de 13%, durante uma hora) e avaliaram suas respostas hormonais e comportamentais. Para avaliar o efeito da temperatura da pele, metade dos avaliados recebeu resfriamento facial (água e gelo, a 4°C, borrifada por 10 segundos), a cada 5 minutos.

Os indivíduos que não receberam o resfriamento facial apresentaram maior concentração plasmática de prolactina e relataram maior desconforto térmico quando comparados aos indivíduos que receberam o resfriamento facial. Este resultado mostrou que a diminuição da temperatura da pele (mesmo sem diminuição da temperatura corporal) leva à redução da concentração de prolactina e do estresse térmico, o que é extremamente benéfico para o desempenho esportivo em ambientes quentes. Essa resposta parece ser mais significativa quando o resfriamento ocorre nas áreas do rosto e da cabeça (devido à grande quantidade de terminações nervosas existentes nesta região).

Em outro estudo feito pelo mesmo grupo, foram avaliadas as respostas funcionais e hormonais em indivíduos submetidos a 40 minutos de exercício em bicicleta sob temperatura de 33°C, com ou sem esfriamento facial. O grupo que recebeu o esfriamento facial apresentou menor frequência cardíaca durante o exercício, menor concentração de lactato (marcador de metabolismo anaeróbio) após 30 minutos de exercício, menor concentração plasmática de prolactina, menor percepção subjetiva de esforço após 40 minutos e menor desconforto térmico (sensação de calor) quando comparado com o grupo controle (sem resfriamento).

Outra maneira de atenuar a elevação da temperatura corporal é a ingestão de líquidos gelados. Estes mesmos pesquisadores avaliaram então, o efeito da temperatura da água (gelada, 4°C ou a temperatura ambiente, 19°C) na ingestão hídrica e na resistência aeróbia de indivíduos exercitados sob 34°C e observaram menor elevação da temperatura corporal, maior ingestão hídrica e maior tempo de exaustão nos que consumiram a água gelada. Porém os resultados sobre a termorregulação foram menos expressivos do que os obtidos com o resfriamento facial.

Assim, durante as partidas em ambientes quentes, aproveite o tempo das viradas para, literalmente, esfriar a cabeça. Utilize sacos com gelo, água gelada, toalha molhada, etc. (como estamos acostumados a ver em torneios como no Aberto da Austrália). Procure locais na quadra que tenham sombra para ficar nos períodos entre os sets e nas trocas de lado de quadra. Como vimos, apenas 10 segundos de esfriamento facial foram suficientes para diminuir a concentração de prolactina e o estresse térmico. Além disso, prefira sempre a ingestão de líquidos gelados (próximas a 4°C). Isso fará você se hidratar mais, ajudando no controle da temperatura corporal e diminuindo o estresse térmico e aumentando sua resistência durante as partidas.

Gustavo Santos é preparador físico; Especialista em Bioquímica; Fisiologia; Treinamento e Nutrição Desportiva; pelo Laboratório de Bioquímica do Exercício (LABEX) da UNICAMP e Mestre em Biologia Funcional e Molecular na área de Fisiologia; pelo Departamento de Anatomia; Biologia Celular e Fisiologia e Biofísica do Instituto de Biologia da UNICAMP.
Trabalha com preparação física de tenistas há 6 anos; tendo trabalhado com tenistas número um do Brasil nas categorias 16 e 18 anos masculinos além do tenista Júlio Silva.

gubasantos@hotmail.com


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